Saudade
"Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sonho"
Mia Couto, Raiz de Orvalho e Outros Poemas, 1979
Etiquetas: poesia; amor
3 Comments:
At 15 abril, 2009 11:59, cancioneiro açoreano said…
http://www.acorestube.com/video/1266/Saudade--Viola-da-Terra
A saudade é um luto
Uma dor, uma aflição
É um cortinado roxo
Que me cobre o coração
Vira e volta a saudade
Para os lados do meu peito
Não cabe um amor tão grande
Num palácio tão estreito
A ausência tem uma filha
Que se chama saudade
Eu sustento mãe e filha
Bem contra a minha vontade
Pus-me a chorar saudade
Ao portal do meu jardim
Uma moça me respondeu
Cala-te tudo tem fim
At 16 abril, 2009 11:30, mãezita said…
Metade
(Oswaldo Montenegro)
Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo que acredito não me tape os ouvidos e a boca.
Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio.
Que a música que eu ouço ao longe seja linda, ainda que triste.
Que a mulher que eu amo seja sempre amada, mesmo que distante.
Porque metade de mim é partida e a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimento.
Porque metade de mim é o que eu ouço, mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço,
Que essa tensão que me corroe por dentro seja um dia recompensada.
Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
Que o espelho reflita em meu rosto o doce sorriso que eu me lembro de ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade eu não sei...
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais.
Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba, e que ninguém a tente
complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.
Porque metade de mim é a platéia e a outra metade, a canção.
E que minha loucura seja perdoada.
Porque metade de mim é amor e a outra metade... também.
Um beijo
mãe
At 17 abril, 2009 11:56, Fernando Pessoa said…
Deixa me ouvir...
Deixa me ouvir o que não ouço...
Não é a brisa ou o arvoredo;
É outra coisa intercalada...
É qualquer coisa que não posso
Ouvir senão em segredo,
E que talvez não seja nada...
Deixa me ouvir...Não fales alto!
Um momento...Depois o amor,
Se quiseres...Agora cala!
Ténue, longínquo sobressalto
Que substitui a dor,
Que inquieta e embala...
O quê? Só a brisa entre a folhagem?
Talvez...Só um canto pressentido?
Não sei, mas custa amar depois...
Sim, torna em mim, e a paisagem
E a verdadeira brisa, ruído...
Vejo te, somos dois...
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