Estamos de menos 11 semanas, a barriga não mexe e a contagem negativa ainda está longe de terminar.
Assim se contam as semanas de uma gestação que se decide em gabinetes, papéis, testes e entrevistas.
Daqui a 11 semanas, se tudo correr bem, seremos finalmente um casal adoptante e poderemos retirar o sinal menos ao tempo desta espera, acrescentando-lhe no entanto muito mais dias (longos mas não maiores).
No total, uma gravidez de adopção dura em média 3 a 4 anos, pelo que teremos à nossa frente a bonita conta de 208 semanas, mais coisa, menos coisa!!!
E isto não porque não existam crianças para adoptar mas porque o processo é complexo e moroso nos tribunais.
Em Portugal a maioria das crianças institucionalizadas não foram dadas para adopção. Quer isto dizer que os pais não consentiram oficialmente em perder a tutela dos filhos ainda que na maioria das vezes os tenham manifestamente abandonado.
Isto cria um problema legal grave uma vez que a criança só pode ser considerada para adopção se, quando institucionalizada, estiver mais de 3 meses sem qualquer visita dos pais biológicos, situação que muitas das vezes não se verifica uma vez que basta uma breve visita à instituição (duas horas, numa tarde perdida, que não se voltam a repetir por mais 3 meses) para que a contagem de tempo recomece novamente.
O mesmo acontece com as crianças que são retiradas às famílias por situações de abusos, maus tratos, negligência, incapacidade e institucionalizadas na sequência deste processo, uma vez que a lei privilegia a possibilidade de reestruturação da família original (que na maioria das vezes não acontece) em vez da efectiva qualidade de vida e equilíbrio das crianças em questão.
É isto que explica que dos cerca de 11 mil menores que vivem em instituições apenas 800 cumpram os requisitos que os tornam "adoptáveis". (dados de 2005)
E é isto que faz também com que, em última análise, a grande entidade parideira para os pais adoptantes sejam os tribunais, e as parteiras de serviço, os juízes!
Ou seja, no meio de tudo, os miúdos são o que menos importa!
O sistema judicial português tende a proteger quase sempre os direitos biológicos pelo que atrasa sistematicamente a resolução destes casos. Há milhares de crianças à espera de uma hipotética reestruturação familiar e outras tantas no espaço delicado do
in between (entre qualquer coisa): com regressos a casa esporádicos (na maioria das vezes falhados), novos abandonos posteriores e a vida suspensa.
Esta situação dificulta grandemente a adopção de bébés, pois apesar de haver muitos, o processo de legalização leva tanto tempo que antes da criança ter um ano dificilmente está resolvido.
Como a maioria dos candidatos deseja, compreensivelmente ter um bébé, as listas de espera são enormes (cerca de 3 mil casais em 2005).
Enquanto isso aqueles que já foram bébés vão crescendo e saindo do estado de graça no que se refere à possibilidade de adopção pois a partir de determinada idade os medos dos pais adoptantes sobrepõem-se à vontade de ter filhos. É que a dificuldade de adaptação a uma nova família não se prende tanto com a idade mas sim com a qualidade e o tipo de vivências que as crianças tiveram e deste modo, os 3 anos (com as histórias de vida que trazem como lastro), surgem como fronteira para a maioria dos casais e como crivo para maioria das crianças.
Como diz Luís Villas Boas, presidente da Comissão de Acompanhamento da Execução da Lei de Adopção, "a celeridade dos processos quando lidamos com bebés e crianças [é] parte integrante dos seus direitos humanos".
E enquanto a celeridade desejada se não concretiza, os dias de todos os envolvidos fazem-se demasiado grandes, mas não maiores, em vidas tão pequenas.