Dias mãeores

um blog de mãe para recuperar o tempo perdido em dias sempre mais curtos que o desejado

terça-feira, novembro 29, 2005

Diário pessoal de Roma - Vaticano





On Danƒe



Faço aqui mais um interrregno ao período romano (já de si de longos intervalos, tão grandes foram os dias por lá passados) para vos recomendar um dos melhores espectáculos de dança que vi nos últimos tempos.

On Danƒe é uma ode à dança de forma descomprometida e criativa.
Em palco desenrola-se um universo de imagens fantásticas e movimentos extraordinários.
As palavras, o movimento, o corpo, as projecções, tudo se entrelaça numa miscelânea espantosa e enche a alma de quem vê e não consegue parar o pé que saltita incontrolável por baixo das cadeiras.
Esta companhia belga, que aprendeu português para poder falar enquanto dança (ou danfa!!!), deixa-nos a todos num delírio sorridente que impede a postura hierática tradicional do público em espectáculos do género.
É impossível não bater palmas a meio das danças de tão entusiasmados que ficamos, é impossível reprimir o sorriso, a gargalhada ou os aahhh! de espanto à medida que as imagens e os corpos nos apanham de surpresa.

Este bailado é uma lufada de ar fresco, com bailarinos e não bailarinos, gordos e magros, elefantes e pintainhos.
Um espectáculo que remete para a diversidade da sociedade contemporânea e fala de inclusão, sincretismo e tolerância recuperando movimentos primordiais de muitas tradições não ocidentais.

Em Lisboa já não há mais espectáculos mas na Culturgest do Porto heverá sessões a 30 de Novembro e 1 de Dezembro.
Se quiserem sair com um sorriso de orelha a orelha, aos saltos pela rua e com formigueiro em todo o corpo não percam!

Obrigado Margarida pela dica!

sexta-feira, novembro 25, 2005

Parque Borghese











O prazer matinal de um imenso parque verde no meio da urbe, cheio de luz, de cheiro a musgo e terra molhada e de bichos em feliz contentamento (humanos incluídos).

quinta-feira, novembro 24, 2005

o direito à autodeterminação dos peões



Premissa maior: Em Roma todos os peões são suicidas!

Atravessar as ruas romanas de maior tráfego é um acto de convicção e uma declaração de guerra.
O espaço listado das passadeiras delineia apenas a fronteira ideológica que separa peões e automobilistas mas na verdade não é mais que uma declaração de intenções, uma área de pura conceptualidade que indica: aqui dever-se-ia atravessar em segurança se!...
Este é o espaço simbólico dos direitos do peão, mas na realidade estes direitos não estão aprovados pela constituição, são meramente indicativos! Ou assim parece.
Por isso, qualquer pessoa que pretenda caminhar e, consequentemente, atravessar a labiríntica e caótica rede viária da cidade, rapidamente aprende que entrou num campo de batalha que exige boa preparação física e nervos de aço.
Colocar o pé no asfalto e iniciar a travessia é um acto de pura convicção e fé.
Deve ser feito com os nervos tensos, preparados para a batalha, e um exercício de mentalização disciplinado repetindo baixinho o mantra: eles vão parar, eles vão parar, eles vão parar!
É que na verdade eles param, a 3 milímetros é certo, mas param, têm é de reconhecer ao peão esta fortaleza de espírito.
Não há tempo nem espaço para hesitações, uma vez dado o primeiro passo é preciso caminhar em linha recta sem contemplações. E acreditar, ó sim, acreditar com muita força.
Cada passadeira uma arena. Cada travessia uma conquista!
Como se o direito de passagem pagasse portagem sob a forma de autodeterminação!

Estes romanos são loucos...

quarta-feira, novembro 23, 2005

servidores

Desculpem, tenho tido um problema no servidor e não tenho conseguido colocar posts. Espero que de hoje em diante tudo volte à normalidade.

sexta-feira, novembro 18, 2005

Andar às voltas



Caminhamos por ruas inundadas de gente e de sol.
O foro imperial arde de luz branca sob um calor de estio fora de época.
Cada pedra, cada capitel, cada coluna representa o tempo que passa e que pesa. Incontornável!

A História em Roma é uma presença corpórea e palpável que acompanha e esmaga, num misto de fascínio e temor.
É fácil perceber porque é que a criação contemporânea só existe fora da capital.
O lastro da memória, do tempo e da História é demasiado difícil de quebrar. Impede o voo como uma esfera de ferro atada a um pé. Como uma âncora.
A libertação exige a fuga, a leveza, o abandono.
E para isso os fragmentos de pedra, os edifícios, as referências têm de ficar para trás.
Ou não... talvez se deixarmos de resistir possamos reinventar a relação com o peso da memória e com esta História feita discurso de pedra.

Assim, embrenhamo-nos na cidade lítica como quem se perde.
Calcorreamos ruas, ruelas, becos, escadas, escadas e mais escadas na tentativa de chegar aos deuses.
Tudo se se apresenta em camadas sobrepostas (e justapostas), capas, níveis, fatias.
Cada percurso é uma incursão arqueológica, cada edifício uma amálgama de espaços que atravessam o tempo.
O próprio labirinto do traçado viário impede a libertação da sensação de mergulho.
É obrigatório perder o Norte! Aqui as distâncias medem-se pela passada ritmada, os referentes habitam nos pináculos e torres. Todos os azimutes são aleatórios.

É preciso aprender a perder-se com puro prazer. Como opção. Como atitude!
Andar às voltas torna-se uma forma de ver e pensar, acentua o tempo necessário para conhecer e sentir o pulsar vivo das coisas por trás do branco das pedras.

E a relação com a cidade cresce neste rodopiar, torna-se o desejo que permite superar o cansaço, os pés doridos, a fome que aperta, a resistência inicial.
Roma conquista de uma forma difícil de explicar. Até a multidão circundante deixa de ser um estorvo para se tornar uma pincelada dinâmica e inconstante de vida, cor e movimento, sensações tão indissociáveis à realidade da cidade como o Caravaggio, o Panteão, o Vaticano ou o trânsito caótico.

Não sei se consigo fazer um relato de viagem fiel. As memórias misturam-se. Acho que só vos posso deixar breves reflexos em toscas pinceladas.

terça-feira, novembro 15, 2005

interregnus romanus



Amici,
esta ausência prolongada deveu-se a um breve interregno para conhecer a história romana, comer gelados, calcorrear vias e escadarias, papar igrejas, evitar o papa (papa horribilis), encher os olhos e o papo de colunas, capitéis, frescos, esculturas e pinturas, e a barriga de pasta, pizza, supli, fiore di zucca e outras iguarias pecaminosas (pecatorum iguariae) que para isso lá estão as igrejas para nos santificarem a posteriori.
Como é óbvio ainda estamos de ressaca pelo que os relatos seguirão em breve.

baci a tutti

(que me perdoem os latinistas por estes atentatos à tão excelsa língua imperial - S.P.Q.R.)

terça-feira, novembro 08, 2005

renascer







Quando acordou, o frio ainda passeava de mansinho nos cantos onde o sol não batia.
A luz escorregava pelos telhados e algerozes dissipando os fiapos de noite e um cheiro a recomeço, próprio dos amanheceres, insinuava-se por entre as frestas das janelas.
Transparente e límpido...

Foi então que viu a árvore tingida de vermelho.
Debruçou-se no parapeito, estendeu a mão e estudou o tempo que corria diferente pelo meio das folhas de fogo.

A árvore apetecia e transpirava sussuros e revolteios, remoinhos e novelos de lã...

Estudou atentamente o salto, ensaiou o impulso e num arco veloz encaixou-se no tecido tenro das folhas.
Enrolada como uma vagem.
Um casulo.
Um ouriço.
Pronta para renascer outra vez.

Lá fora a luz andava solta pelos beirais...

..........


Obrigado a todos aqueles que me têm ajudado a renascer, sucessivamente.

quinta-feira, novembro 03, 2005

danças nas alturas







... e quando pensavam que ninguém olhava, os operários inquietos faziam acrobacias no ar como pássaros loucos em dia de vento...